Economia

Onyx elogia 'bases macroeconômicas' do governo Pinochet e diz que Chile 'teve que dar um banho de sangue'

Ministro da Casa Civil defendeu necessidade de 'grande pacto' por nova Previdência
Onyx Lorenzoni: elogios às políticas de Pinochet Foto: Jorge William / Agência O Globo
Onyx Lorenzoni: elogios às políticas de Pinochet Foto: Jorge William / Agência O Globo

BRASÍLIA - Horas antes de o presidente Jair Bolsonaro embarcar rumo a Santiago, para iniciar visita oficial ao Chile, o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, elogiou as "bases macroeconômicas" fixadas no governo do ditador Augusto Pinochet (1973-1990) ao defender a necessidade de uma reforma da Previdência no Brasil. Lorenzoni afirmou que o chileno "teve que dar um banho de sangue" nas ruas no país, o que classificou como "triste". As declarações foram feitas em entrevista à Rádio Gaúcha, na manhã desta quinta-feira.

— O que nós temos que ter consciência é que, neste momento, ou o Brasil faz um grande pacto, superamos as dificuldades inclusive ideológicas, no sentido de poder construir um futuro para o nosso país, ou não temos futuro — disse o ministro, mencionando em seguida um exemplo negativo, da Grécia, e um positivo, segundo ele, do Chile.

— No período Pinochet, o Chile teve que dar um banho de sangue. Triste. O sangue lavou as ruas do Chile, mas as bases macroeconômicas fixadas naquele governo... Já passaram oito governos de esquerda e nenhum mexeu nas bases macroeconômicas colocadas no Chile no governo Pinochet.

Após a saída do ditador chileno da Presidência, em março de 1990, o país sul-americano teve apenas cinco presidentes — dois deles eleitos duas vezes: o atual, Sebastián Piñera (2010-2014 e desde 2018) e Michelle Bachelet (2006-2010 e 2014-2018). Pinochet morreu em 2006.

Onyx também mencionou o atentado a faca sofrido por Bolsonaro, então candidato ao Palácio do Planalto, em setembro do ano passado.

— No Brasil, infelizmente para o presidente Bolsonaro, mas felizmente para toda a sociedade brasileira, para que a transformação chegasse nesse momento, só correu o sangue do presidente Bolsonaro, de mais ninguém — declarou o ministro.

Ainda durante a conversa com os jornalistas da Rádio Gaúcha, que durou cerca de 25 minutos, o ministro foi indagado sobre a sua referência à necessidade do banho de sangue no Chile, que rendeu comentários indignados de ouvintes, e rebateu com perguntas:

— É só história, né? Não teve uma revolução sangrenta? — questionou.

Em seguida, enumerou qualidades do país vizinho como a renda per capita de US$ 24 mil ao ano, a "absoluta independência", prosperidade e educação de qualidade.

— Porque foram lançadas as bases que permitiram que este país pudesse se consolidar — disse.

Em seguida, ele declarou que, "provavelmente, a turma da esquerda se incomodou porque eu reconheci algum mérito no governo Pinochet". A jornalista Rosane de Oliveira, então, frisou que as pessoas se incomodaram pela fala do "banho de sangue".

“No Brasil, para que a transformação chegasse nesse momento, só correu o sangue do presidente Bolsonaro, de mais ninguém”

Onyx Lorenzoni
ministro-chefe da Casa Civil

— E no Brasil, que o presidente teve que dar o seu sangue? Ninguém fala, ninguém ficou revoltado? — rebateu o ministro, já no fim da entrevista, que foi concedida antes das prisões do ex-presidente Michel Temer (MDB) e do ex-ministro Moreira Franco (MDB).

Após liderar um golpe militar em 1973, Pinochet ficou no poder durante 17 anos. A ditadura chilena é considerada uma das mais sangrentas da América Latina e deixou mais de 3 mil mortos e desaparecidos, segundo estimativas de historiadores e organizações de direitos humanos. Após deixar o poder, Pinochet chegou a ser detido em Londres, alvo de um mandado de busca e apreensão internacional por crimes de abuso dos Direitos Humanos. Ele foi extraditado para o Chile, onde sofreu vários processos mas viveu em liberdade até morrer em 2006.

Tramitação da reforma da Previdência

O ministro da Casa Civil foi questionado também sobre a previsão do governo para a tramitação da proposta da "Nova Previdência" no Congresso e disse que, "provavelmente entre hoje e amanhã" ocorrerá a designação do projeto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.

Nesta quinta-feira, porém, o presidente da CCJ, deputado Felipe Francischini (PSL-PR), adiou a indicação do relator para a reforma da Previdência porque, segundo ele, é preciso ter esclarecimentos sobre a proposta para os militares.

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Na entrevista à Rádio Gaúcha, Onyx afirmou acreditar que a proposta da reforma deve ir ao plenário até o fim de maio.

— Nós achamos que até o final de maio devemos estar em condições de levar a proposta ao plenário da Câmara [...] Primeira semana de junho, definido o segundo turno [da votação], indo para o Senado Federal — disse Onyx.

Ele disse acreditar "firmemente" que o projeto será aprovado no Senado antes do recesso parlamentar no Congresso.

Declarações causaram indignação

As declarações de Onyx  causaram indignação. O professor da Faculdade de Economia e Finanças da USP, Luis Eduardo Afonso, considerou as afirmações “completamente fora de sentido”:

— A analogia feita foi pior ainda. Todos os 34 países da OCDE fizeram reformas previdenciárias em regimes democráticos. Além disso, o sistema de capitalização do Chile já sofreu várias modificações, como mais peso para pilar básico, não contributivo, e complementação para aqueles que não conseguem economizar para receber o benefício mínimo.

A crise financeira de 2008 corroeu a poupança dos trabalhadores, que ficaram completamente fragilizados, sem ter a quem recorrer, lembra o professor de História da América Latina da Unesp, Alberto Aggio:

— Lorenzoni esqueceu de mencionar a crise que veio depois das reformas liberalizantes impostas pela ditadura. Houve uma crise tão grande no Chile que os historiadores afirmam que ela foi equivalente à  crise de 1929. Houve dois exílios no Chile, quando houve o golpe, por motivos políticos e outro entre o fim dos anos 1970 e início dos anos 1980, por motivos econômicos. Não havia como sobreviver, não tinha emprego.