Edição do dia 21/06/2018

21/06/2018 21h38 - Atualizado em 21/06/2018 21h42

Justiça quer relatório sobre operação na Maré em que menino morreu

Marcos Vinícius, de 14 anos, levou um tiro na barriga quando ia para a escola. Polícia Civil fazia operação com apoio do Exército na comunidade.

Parentes e amigos se despediram, nesta quinta-feira (21), do estudante de 14 anos que morreu quando ia para a escola no conjunto de favelas da Maré, no Rio de Janeiro. Marcos Vinícius da Silva foi baleado na barriga.

De um dia para o outro, a mochila com cadernos, com uniforme viraram símbolos da violência. “É minha bandeira”, diz a mãe. O filho da Bruna estava a caminho da escola. Marcos Vinícius da Silva estava atrasado, tinha perdido a hora. Quando passava, foi atingido por um tiro na barriga. O estudante não sabia que a Polícia Civil fazia uma operação com apoio do Exército na comunidade.

O adolescente foi levado para o hospital e operado na quarta-feira (20) à tarde. À noite, o estudante de 14 anos não resistiu à tamanha violência.

O principal objetivo da operação era encontrar os assassinos do inspetor da Polícia Civil Ellery Ramos, morto na semana passada. Seis suspeitos morreram. Com eles, os agentes apreenderam armas, munição e drogas. Ninguém foi preso.

Durante a ação, o helicóptero da Polícia Civil dava rasantes sobre as casas. Moradores relataram que tiros foram disparados da aeronave. Na semana passada, em uma outra operação, a Polícia Civil também usou helicóptero

Na quarta-feira, as marcas dos disparos ficaram no chão. Moradores contabilizaram 59 tiros em 280 metros.

“Cinquenta crianças vítimas de balas perdidas de 2017 até agora; 28 nos últimos dois anos e meio; oito em 2018. O que nós queremos é uma ação inteligente”, afirma Antônio Carlos da Costa, presidente da ONG Rio da Paz.

Os moradores não ficaram calados. Estudantes do colégio onde Marcos Vinícius estudava protestaram. Um policial militar ameaçou bater em uma mulher. A Polícia Militar declarou que abriu um procedimento para apurar as circunstâncias.

Os pais culpam a polícia pela morte de Marcos Vinícius. A mãe contou que ainda conseguiu conversar com o filho mesmo depois de baleado, e que o menino disse que viu de onde veio o disparo.

“Quando cheguei na UPA, ele estava com vida. O meu filho falou para mim: ‘Mãe, eu tomei um tiro’. Eu falei: ‘Meu filho, não fala, fica calado’. Ele respondeu: ‘Mãe, eu sei quem atirou em mim, eu vi quem atirou em mim’. Perguntei: ‘Meu filho quem foi que atirou em você? ‘Foi o blindado mãe. Ele não me viu com a roupa de escola’”, conta a mãe do estudante.

“O rapaz que socorreu ele, na hora de tudo, viu que estavam olhando para ele, e atiraram assim mesmo”, disse José Gerson da Silva, pai de Marcos Vinícius.

A Polícia Civil abriu um inquérito. Afirmou que o helicóptero em operações é para garantir a segurança dos moradores e dos policiais e que não há registro de alguém atingido por tiros vindos da aeronave na Maré.

A polícia não informou se existe um protocolo para a atuação do helicóptero em operações, e também não respondeu sobre a acusação de que o tiro que matou Marcos Vinícius saiu de um blindado.

Uma perícia foi feita no lugar em que Marcos Vinícius foi baleado. O laudo do IML concluiu que a bala atingiu o menino na região lombar esquerda, de trás para frente, ou seja, nas costas, da esquerda para a direita. 

O corpo de Marcos Vinícius chegou ao cemitério no fim da tarde desta quinta sob aplausos. Estava escuro quando Marcos Vinícius foi sepultado. O menino que tinha um sorriso iluminado.

Nesta quinta (21), a Justiça negou um pedido de liminar feito pela Defensoria Pública do Rio para proibir sobrevoos e disparos de aeronaves durante as operações no Complexo da Maré. A defensoria informou que vai recorrer.

A Justiça também determinou que a Polícia Civil apresente um relatório dessa operação em dez dias. O gabinete de intervenção federal na segurança do Rio não respondeu ao pedido de entrevista do Jornal Nacional. A Secretaria de Segurança Pública do estado não quis se pronunciar.